TRF3 confirma concessão de BPC a jovem autista imigrante da Venezuela
Decisão reforça proteção social a crianças com deficiência e reconhece direito de imigrantes a benefícios assistenciais no Brasil
A 10ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e manter a concessão do Benefício de Prestação Continuada (BPC) a um jovem com autismo severo e deficiência intelectual, filho de uma imigrante venezuelana. O julgamento ocorreu no dia 11 de junho de 2025, sob relatoria da desembargadora federal Gabriela Araujo.
O caso
A ação foi ajuizada em abril de 2024 por um jovem imigrante venezuelano, representado por sua mãe. O pedido buscava a concessão do BPC desde a data do requerimento administrativo, realizado em 29/02/2020.
O juízo de primeira instância havia reconhecido o direito ao benefício, entendendo estarem preenchidos os requisitos legais previstos no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal e no artigo 20 da Lei nº 8.742/1993 (LOAS). O INSS recorreu, sustentando que o termo inicial deveria ser fixado apenas a partir da intimação do laudo socioeconômico.
Condição socioeconômica da família
O estudo social realizado em junho de 2024 constatou que o autor, nascido em 2005, reside apenas com a mãe em um imóvel alugado de três cômodos, em condições precárias. A única renda da família é o benefício do programa Bolsa Família, no valor de R$ 650,00.
Segundo a assistente social, a família sobrevive com doações de vizinhos e de igrejas da região. A mãe relatou ser a única cuidadora do filho, diagnosticado com autismo severo aos dois anos de idade, sem apoio do genitor, que permanece na Venezuela. Um irmão mais velho, com autismo leve, já não vive no mesmo lar desde 2021, o que afastou a inclusão de sua renda no cálculo do benefício.
Fundamentação da decisão
Em seu voto, a relatora Gabriela Araujo destacou que a situação de vulnerabilidade do núcleo familiar é agravada pela condição de imigrantes, ressaltando a aplicação da Lei de Migração (Lei nº 13.445/2017), que garante aos migrantes acesso igualitário a serviços públicos, programas sociais e à seguridade social, sem discriminação por nacionalidade.
O acórdão também citou a Recomendação nº 128/2022 do CNJ, que institui o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero. A desembargadora ressaltou que a mãe, estrangeira, sem rede de apoio e dedicada exclusivamente ao cuidado do filho, encontra-se impossibilitada de ingressar no mercado de trabalho. Esse contexto reforça a necessidade de considerar a sobrecarga do trabalho de cuidado desempenhado por mulheres, em consonância com a Política Nacional de Cuidados (Lei nº 15.069/2024).
O tribunal observou ainda que, mesmo se considerada a renda do irmão, o requisito de hipossuficiência estaria preenchido, uma vez que o artigo 20-B da LOAS permite avaliar outros elementos da condição de miserabilidade, como dependência de terceiros, gastos com saúde e medicamentos não fornecidos pelo SUS.
Decisão
A 10ª Turma do TRF3 manteve a sentença que fixou o termo inicial do benefício assistencial na data do requerimento administrativo (29/02/2020), assegurando o direito do jovem e reconhecendo a hipossuficiência da família. O recurso do INSS foi integralmente rejeitado.
Fonte: TRF3 – Apelação Cível nº 5001132-43.2024.4.03.6144.
Acórdão.