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Nota Técnica IEPREV 09/2020 - TEMA 1102 DO STF - Análise de repercussão geral da tese da revisão da vida toda

NOTA TÉCNICA SOBRE O TEMA 1102 DO STF

ANÁLISE DE REPERCUSSÃO GERAL DA TESE DA REVISÃO DA VIDA TODA
 

O IEPREV – Instituto de Estudos e Pesquisas em Direito Previdenciário, em cumprimento às suas finalidades de discussão e difusão científica a respeito desse direito fundamental social, vem a público emitir algumas considerações técnicas a respeito do Tema 1.102 da repercussão geral, que se encontra no Plenário Virtual do STF para análise da configuração da repercussão geral.

 

***

 

O Supremo Tribunal Federal está debatendo, no Plenário Virtual, o Tema 1.102, discutindo inicialmente se ocorre a configuração da repercussão geral (arts. 102, § 3º, da Constituição Federal e 1.035 do CPC/2015) do tema da tese revisional previdenciária conhecida como revisão da vida toda.

É importante frisar que esse tema não é dotado de repercussão geral porque sequer se trata de matéria com respaldo constitucional direto.

A disciplina do cálculo do valor dos benefícios previdenciários é, desde as alterações introduzidas pela Emenda Constitucional 20/98, matéria de cunho essencialmente infraconstitucional.

A forma de cálculo dos benefícios previdenciários era contemplada na redação original do art. 202, do Texto Constitucional, adiante transcrito:

 

Art. 202. É assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-se o benefício sobre a média dos trinta e seis últimos salários de contribuição, corrigidos monetariamente mês a mês, e comprovada a regularidade dos reajustes dos salários de contribuição de modo a preservar seus valores reais e obedecidas as seguintes condições:

 

Esse dispositivo, contudo, foi alterado pela Emenda Constitucional 20/98, que o dedicou à Previdência Complementar. Doravante a questão do cálculo do valor dos benefícios previdenciários restou a cargo do art. 201, § 3º, que apenas sinaliza a atualização dos salários de contribuição e remete a forma de cálculo à norma infraconstitucional:

 

§ 3º Todos os salários de contribuição considerados para o cálculo de benefício serão devidamente atualizados, na forma da lei.

 

Vale dizer que a metodologia de cálculos do valor dos benefícios previdenciários somente retorno ao bojo do Texto Constitucional com o art. 26 da Emenda Constitucional 103/2019. Antes dessa recente alteração normativa, porém, prevalece a compreensão já mencionada acima, no sentido de que se trata de matéria evidentemente infraconstitucional.

Assim, a tese da revisão da vida toda só alcança a Constituição Federal indireta ou reflexamente, configurando a barreira de admissibilidade dos recursos extraordinários que é bastante conhecida como ofensa indireta ou ofensa reflexa à Constituição. Nas palavras do Mestre Araken de Assis:

 

“Entende-se por ofensa reflexa, oblíqua ou indireta a necessidade de interpretar norma infraconstitucional ou tratado para chegar à conclusão que sua aplicação violou norma constitucional. (...) Em tais casos, inexistirá repercussão geral.”

(ASSIS, Araken. Manual dos Recursos, 9ª ed., S. Paulo: Revista dos Tribunais, 2017, p. 896)

 

É importante registrar que há inúmeros precedentes do próprio STF em que se decidiu que a apreciação desse tema incidiria na análise de legislação infraconstitucional, o que inviabiliza a própria admissão do recurso extraordinário: ARE 1.216.156, Relator Ministro Gilmar Mendes, publicacao em DJe-101 de 27/4/2020; RE 1.258.980, Relator Ministro Luiz Fux, publicacao em DJe-058 de 16/3/2020; ARE 1.193.778, Relator Ministro Alexandre de Moraes, publicacao em DJe-055 de 21/3/2019; ARE 1.173.002, Relator Ministro Celso de Mello, publicacao em DJe-262 de 6/12/2018; ARE 1.130.537, Relator Ministro Edson Fachin, publicacao em DJe-110 de 5/6/2018.

No mesmo rumo, pode-se sublinhar que os dois votos que já foram apresentados no Plenário Virtual quanto ao Tema 1102 admitem que a tese da revisão da vida toda não configura reafirmação de jurisprudência.

De fato, não se trata de reafirmar jurisprudência, visto que esta não há, dado que o STF vêm até então compreendendo que o tema é infraconstitucional.

O julgamento desta primeira fase, no plenário virtual, tem previsão para ser concluído agora no dia 27 de agosto, razão pela qual o IEPREV emite a presente nota técnica externando sua preocupação com o eventual juízo de admissibilidade do RE interposto pelo INSS. Eis o atual placar:



Tema

1102 - Possibilidade de revisão de benefício previdenciário mediante a aplicação da regra definitiva do artigo 29, incisos I e II, da Lei nº 8.213/91, quando mais favorável do que a regra de transição contida no artigo 3º da Lei nº 9.876/99, aos segurados que ingressaram no Regime Geral de Previdência Social antes da publicação da referida Lei nº 9.876/99, ocorrida em 26/11/99.

Classe: RE
Número: 1276977
Data de Início: 07/08/2020
Data Prevista Fim: 27/08/2020

Relator: MINISTRO PRESIDENTE

 


Ministro

Questão

Constitucional

Repercussão

Geral

Reafirmação de
Jurisprudência


Manifestação

MIN. DIAS TOFFOLI

Não

 

MIN. GILMAR MENDES

Não

 

MIN. ROSA WEBER

Não

 

MIN. MARCO AURÉLIO

-

 

MIN. CÁRMEN LÚCIA

-

-

-

 

MIN. CELSO DE MELLO

-

-

-

 

MIN. ROBERTO BARROSO

-

-

-

 

MIN. RICARDO LEWANDOWSKI

-

-

-

 

MIN. ALEXANDRE DE MORAES

-

-

-

 

MIN. EDSON FACHIN

-

-

-

 

MIN. LUIZ FUX

-

-

-

 
 

Em linhas gerais, deve-se resgatar que desde a própria implementação da sistemática do fator previdenciário, com a Lei 9.786/99, que regulamentou as alterações trazidas pela Emenda Constitucional 20/98, a metodologia de cálculo dos benefícios previdenciários é matéria infraconstitucional na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.

Com efeito, a ADI 2.111/DF, ao decidir pela constitucionalidade do fator previdenciário, então recém implementado, fundamentou-se no sentido de que se tratava de simples e necessária regulamentação legal de dispositivo constitucional.

Por todos estes argumentos, espera-se que o Excelso Pretório não reconheça a repercussão geral da matéria, visto que o conteúdo tratado no Tema 1102 não possui envergadura constitucional.

 

Belo Horizonte, 24 de agosto de 2020.

 

MARCO AURÉLIO SERAU JUNIOR

Diretor Científico

ROBERTO DE CARVALHO SANTOS

Presidente