IEPREV - Aposentadoria por Idade do Trabalhador Urbano no Regime Geral de Previdência e a Utilização da Tabela Progressiva

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Aposentadoria por Idade do Trabalhador Urbano no Regime Geral de Previdência e a Utilização da Tabela Progressiva

 


Adriana Ramalho Gonçalves - Especialista em Direito Previdenciário - IEJA


INTRODUÇÃO

 

Importante instituto do Direito Previdenciário que será enfatizado nesse trabalho, é a aposentadoria por idade, que mereceu destaque desde os primórdios legislativos nacionais e internacionais, como preocupação com o amparo às pessoas idosas, cuja origem é indissociavelmente ligada ao nascedouro da seguridade social.

 

Desde que surgiram os primeiro modelos de previdência privada, a idéia que inspirou o sistema foi de se prover um fundo comum para amparar seus instituidores e respectivos dependentes, acaso atingidos por infortúnios previstos como ensejadores de percebimento de benefícios, bem como para antecipando a superveniência da idade avançada, garantir recursos para a subsistência.

 

Posteriormente, a obrigação de contribuir para um fundo comum com o objetivo de amparar  situações de necessidade passou a ser partilhada com o Estado, para o qual transferiu-se sua gestão, diluindo-se, assim, entre um número maior de pessoas, a responsabilidade de patrocínio do sistema de proteção, ampliando igualmente o número de indivíduos amparados e fatos jurídicos ensejadores dos benefícios sociais.

 

Destacaremos a ocorrência da situação idade avançada ou velhice, que enseja benefício previdenciário de caráter retributivo, a ser concedido àqueles que estiveram sujeitos ao desconto regular de seus ganhos, para que o futuro lhes fosse menos incerto.

 

É cada vez maior a proporção de idosos que estão se aposentado  e daí, a estreita relação entre aposentadoria e envelhecimento.

 

Para falar da aposentadoria por idade, temos que destacar a condição de pessoa idosa, cuja definição não é precisa. Não existe um consenso sobre o momento em que se pode considerar idoso um indivíduo. As características inerentes à idade avançada são de todos conhecidas, especialmente o declínio orgânico e, de modo geral mental, o sexo(homem ou mulher); no entanto, estas características se apresentam em momentos variados, dependendo de uma série de fatores, como condições econômicas, qualidade de vida, e até mesmo o aumento da expectativa de vida. Do ponto de vista individual a idade é um dado precário, pois varia muito de uma pessoa para outra o marco do envelhecimento.

 

A aposentadoria por idade vem sendo fixada tomando por base a idade cronológica, isto é, o número de anos de vida, pois, é com base nesses dados que comumente cogitamos a densidade demográfica, origem do que se conhece como envelhecimento da população.

 

A aposentadoria por idade é o mais importante benefício da previdência social. O limite estário mínimo para o direito a ela varia de uns países para outros, mas os critérios mais freqüentes são 65 anos para os homens e 60 anos para as mulheres, com tendência no sentido de um mínimo único para ambos os sexos.

 

O privilégio etário das mulheres quanto à capacidade laborativa tem importantes repercussões na aposentadoria por idade. O privilégio da mulher em aposentar-se cinco anos antes que o homem, aponta para a conclusão de que se considera que aquela tem diminuída  sua força vital para o trabalho antes do homem. Ainda que cientificamente não se possa fazer tal afirmação, fato é que a lei antecipa a velhice feminina.

 

A Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 1988, prevê no Título VIII que trata da ordem social, mais especificamente na seção III da previdência social, que:

“Art.201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados os critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termo da lei, a:

I-  cobertura dos eventos de doença invalidez, morte e idade avançada;

(...)

§7º É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, obedecidas as seguintes condições:

I- 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem, e 30(trinta) anos de contribuição, se mulher;

II- 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60(sessenta) anos, se mulher, reduzido em 5(cinco) anos o limite para os trabalhadores rurais de ambos os sexos e para os que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, nestes incluídos o produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal.

(...)”

 

No seio da Constituição Federal o princípio do primado do trabalho está colocado como a base da ordem social. Também está assentado no bojo da Constituição que é por meio do primado do trabalho, enquanto escoro da ordem social, que se alcançará o bem-estar e a justiça social. É através da concretização do trabalho por muitos anos, que milhares de segurados aguardam com ansiedade completarem a idade para enfim alcançarem a almejada aposentadoria por idade. 

 

A cooperação de todos os seres humanos deve estar concentrada na utilização do trabalho com a finalidade do mesmo ser útil para satisfação de suas necessidades.

 

Os direitos dos trabalhadores devem ser prestigiados quando da elaboração e interpretação das normas jurídicas, tendo por finalidade a melhoria das condições de vida aos hipossuficientes, visando à concretização da igualdade social.

 

A Declaração Universal dos Direitos Humanos, proclamada pela Assembléia Geral das Nações Unidas, de 10 de dezembro de 1948, dispõe em seu preâmbulo que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo; bem como a promoção do progresso social e melhores condições de vida e a ampla liberdade devem  estar amparadas em direitos fundamentais do homem, da dignidade e no valor da pessoa humana e na igualdade de direitos do homem e da mulher. Esses princípios estão fincados na experiência histórica da humanidade e na sua evolução científica-filosófica.

 

No Brasil, a Constituição da República de 1988 consagrou o princípio fundamental da proteção da dignidade humana como um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito.

 

José Afonso da Silva, tentando definir a intenção do Legislador Constituinte ao consagrar a dignidade da pessoa humana como valor fundamental na construção do ordenamento jurídico, atribuiu diversos significados a palavra dignidade empregando-a em diferentes contextos: dignidade social, dignidade espiritual, dignidade intelectual e dignidade moral. Sustentou, ainda, que esses tipos de dignidade compõem o comportamento humano, mas que a dignidade prescrita na Constituição reporta-se a um atributo inerente ao ser humano, como “valor de todo o ser racional” e em virtude disso é que uma pessoa não pode ser privada de seu direito fundamental: a vida. (SILVA, 1996)

 

O princípio da dignidade da pessoa humana consagrado tanto na Declaração Universal dos Direitos Humanos quanto pela Constituição Federal do Brasil de 1988, prevê um direito protetivo em relação ao Estado e aos demais indivíduos, fundamentado na incessante busca de viabilizar os direitos básicos dos cidadãos, preservando a dignidade existente ou criando mecanismos para o seu exercício, além de estabelecer um dever fundamental de tratamento igualitário dos próprios semelhantes. Nesse diapasão consideramos que a aposentadoria por idade vem consagrar tal princípio constitucional a milhares de brasileiros.

 

O constituinte traçou diversos institutos, igualmente inscritos na Carta Constitucional, que visam determinar a atuação estatal, buscando manter o princípio da dignidade da pessoa humana. Dentre eles, destaca-se a Previdência Social, que, embora organizada com caráter contributivo (art. 201, caput, CR), orienta-se, principalmente, para a cobertura de eventos de doença, invalidez, morte, idade avançada, proteção à maternidade, amparo ao trabalhador desempregado ou recluso (incisos I a V do art. 201 da CR).

 

Em verdade, tais eventos representam riscos sociais que, influenciando na capacidade da pessoa de manter, por seu trabalho, a si e a sua família, constituem o elemento material da regra jurídica de proteção, dando suporte a uma prestação devida pelo Estado ao segurado ou aos seus dependentes.

 

Pois bem, enfatizaremos o tratamento dispensado a condição da pessoa idosa, e que efetivamente laborou e contribuiu aos cofres da previdência social, e que após completar a idade prevista na legislação pátria, busca frente a autarquia previdenciária a concessão da aposentadoria por idade.

 

Sabemos que as constantes alterações na legislação previdenciária, elaboradas com a finalidade de manter o equilíbrio atuarial, cada vez mais acumulam exigências para a concessão dos benefícios.

 

No caso da aposentadoria por idade, com a edição da Lei N º10.666/03, felizmente felizmente houve uma inversão da regra, no tocante aos requisitos à concessão da aposentadoria especial, por tempo de serviço e por idade, da qual surtiu efeitos positivos. É inegável a evolução do pensamento jurídico neste aspecto, permitindo a adequação da lei ao entendimento consolidado pelos Tribunais, num exemplo de interação perfeita. A lei mencionada trouxe inúmeras modificações ao ordenamento jurídico, mas será sob a questão da aposentadoria por idade que seguiremos o estudo.

 

Mesmo com o avanço legislativo os segurados ainda não têm amplamente resguardados o direito à aposentadoria por idade. Para mostrar que infelizmente a autarquia previdenciária vem realizando exigências que transcendem a aplicação da legislação previdenciária, e que vem legislando através de instruções normativas, e com isso impedindo o acesso a aposentadoria por idade a muitos segurados, que descreveremos a legislação previdenciária sobre o tema, mostraremos a prática adotada nas agências do INSS, e os motivos que levam a autarquia previdenciária a indeferir tais benefícios.

 

Esta lógica tem, contudo, uma exceção que, a cada dia, provoca um grande número de ações judiciais. Trata-se da aposentadoria por idade nos casos em que o segurado completou o requisito etário e ao requerer a aposentadoria lhe é exigida a comprovação do número de meses de contribuição na data da entrada do requerimento, e não de quando completou os requisitos legais.

 

No presente estudo tentaremos traçar o fundamento que justificou os primeiros julgados que deram origem a esta hipótese excepcional; para, em seguida, indicar o novo parâmetro normativo e suas conseqüências práticas, seja para o cálculo do benefício devido, seja para  definir qual o requisito de carência  a ser exigido dos segurados que já eram filiados ao sistema previdenciário antes de 1991, com a utilização da tabela progressiva.

 

I - APOSENTADORIA POR IDADE NO DIREITO COMPARADO

 

Para enriquecimento do tema proposto e como forma de trazer ao debate como o mundo tem tratado seus idosos, e como nosso país aborda o tema, vamos utilizar informações colhidas na doutrina pátria.

 

Alguns países concedem aposentadoria por idade até para emigrantes, necessitando apenas da comprovação que já verteram contribuições aos cofres do país de origem, independentemente de que recebam aposentadoria no país onde residem atualmente. Verificamos também que além do requisito etário, também há a exigência da comprovação da carência (lê-se número mínimo de contribuições).

 

Utilizando tabela divulgada por Sérgio Pinto Martins (MARTINS, 2006, p.358/359), acrescentamos ainda a carência exigida por alguns países como caráter informativo.

PAÍSES

IDADE HOMENS

IDADE MULHERES

CARÊNCIA

Alemanha

63

60

5 anos

Austrália

65

60

 

Argentina

65

60

 

Áustria

65

60

 

Bélgica

65

60

 

Brasil

65

60

15 anos e/ou tabela progressiva para quem tem inscrição na previdência anterior a 07/94

Canadá

65

65

 

Chile

65

60

 

Colômbia

65

65

 

Costa Rica

60

60

 

Cingapura

55

55

 

Cuba

60

55

 

Dinamarca

67

67

 

Espanha

65

65

5 anos

EUA

65

65

 

Finlândia

65

65

 

França

65

65

3 meses

Grécia

65

60

 

Holanda

65

65

 

Indonésia

60

55

 

Inglaterra

67

62

 

Irlanda

65

65

 

Israel

65

65

 

Itália

65

60

5 anos

Japão

65

65

 

Luxemburgo

65

60

 

Malásia

55

55

 

México

65

65

 

Noruega

67

67

 

Nova Zelândia

60

60

 

Paraguai

60

60

 

Portugal

65

65

 

Suécia

65

65

 

Suíça

65

62

12 meses

Taiwan

60

55

 

Uruguai

60

60

 

Pelas informações levantadas salientamos que o modelo brasileiro distancia-se do modelo adotado por inúmeros países, pois,  a carência exigida de 180 contribuições, que equivale a 15 anos, visa apurar mais contribuições aos cofres públicos, e distancia inúmeros brasileiros da aposentadoria por idade. Estamos conscientes que o Brasil envelhece em ritmo acelerado, e infelizmente não está preparado para lidar com o envelhecimento rápido da população, porque infelizmente o país não enriqueceu antes de envelhecer.

 

Pela tabela supramencionada, pode-se verificar que para fins de concessão de aposentadoria por idade, a idade  exigida varia de 55 a 67 anos, enquanto alguns países adotam diferença etária entre homens e mulheres, outros colocam o mesmo limite de idade para ambos os sexos.

 

Cabe ressaltar que no Brasil, para fins assistenciais, o idoso é a pessoa independente do sexo, que tenha 65 anos de idade, restando claro que o conceito de idade avançada também é relativo quando se trata de diferentes benefícios (previdenciário ou assistencial), além da relatividade entre gênero e natureza do trabalho.

 

As exigências contidas na legislação brasileira para a concessão da aposentadoria por idade, tem sido palco de inúmeras interpretações doutrinárias e jurisprudenciais. No cotidiano os segurados buscam informações junto à Previdência, que muitas vezes não os atendem, e cada dia que passa um contigente maior de idosos têm intentado com ações judiciais visando terem concedidas aposentadorias por idade, infelizmente muitos não conseguem sequer receberem tais benefícios, porque falecem antes do término da demanda. 

 

A leitura e interpretação de tais normas deveria ser feita pela autarquia previdenciária, através de servidores mais bem preparados e que pudessem aplicar a norma com olhos sociais,  visando a dignidade da pessoa humana.

 

II - APOSENTADORIA POR IDADE EM ÂMBITO CONSTITUCIONAL EVOLUÇÃO HISTÓRICA

 

No império, a Carta Constitucional (1824) não trazia nenhum dispositivo atinente ao amparo à velhice, seja sob o enfoque previdenciário, seja sob o enfoque assistencial. Trazia apenas referência ao fato de que a Constituição também garante os socorros públicos, consoante expresso em seu art.179, XXI.

 

Na Constituição de 1891, também não há dispositivo amparando à velhice; mas na vigência dessa Constituição sobreveio a Lei Elói Chaves (Decreto nº4.682, de 24.01.1923), que foi “a primeira norma a instituir no Brasil a previdência social, com a criação de Caixas de Aposentadorias e Pensões  para  os ferroviários em nível nacional” , a qual curiosamente, não previa qualquer benefício ao idoso, dispondo apenas sobre a aposentadoria por invalidez, ordinária (equivalente à aposentadoria por tempo de serviço), a pensão por morte e assistência médica.

 

A Lei Maior de 1934 previa instituição de previdência em favor da velhice, no art.121, 1º, h:

Art.121. A lei promoverá o amparo da produção e estabelecerá as condições do trabalho, na cidade e nos campos, tendo em vista a proteção social do trabalhador e os interesses econômicos do País.

§1º. A legislação do trabalho observará os seguintes preceitos, além de outros que colimem melhorar as condições do trabalhador:

(...)

h) assistência médica e sanitária ao trabalhador e à gestante, assegurado a esta descanso antes e depois do parto, sem prejuízo do salário e do emprego, e instituição de previdência, mediante contribuição igual da União, do empregador e do empregado, a favor da velhice, da invalidez, da maternidade e nos casos de acidentes de trabalho ou de morte;

 

Já a Constituição de 1937, muda a redação anterior, especificando no art.137, m,  a instituição de seguros de velhice, nos seguintes termos:

Art.137. A legislação do trabalho observará, além de outros, os seguintes preceitos:

(...)

m) a instituição de seguros de velhice, de invalidez, de vida e para os casos de acidentes do trabalho;

 

A Carta Constitucional de 1946, evidencia tal preceito no art.157, XVI, quando determina  a previdência em favor da velhice:

Art.157. A legislação do trabalho e da previdência social obedecerão nos seguintes preceitos, além de outros que visem a melhoria da condição dos trabalhadores:

(...)

XVI- previdência, mediante contribuição da União, do empregador e do empregado, em favor da maternidade e contra as conseqüências da doença, da velhice, da invalidez e da morte;

 

A Lei  Nº 3.807/60 prescrevia no art.30 a aposentadoria por velhice, estabelecendo critérios etários diferenciados para homens e mulheres, bem como a necessidade de contribuição, quando do sexo feminino, a saber:

Art.30. A aposentadoria por velhice será concedida ao segurado que, após haver realizado 60 (sessenta) contribuições mensais, completar 65(sessenta e cinco) ou mais anos de idade, quando do sexo masculino, e 60(sessenta) anos de idade, quando do sexo feminino e consistirá numa renda mensal calculada na forma do §4º do art.27. (Revogado pela Lei nº 5.890, de 1973, que passou a dispor sobre este benefício).

 

A Carta Magna de 1967 passa a usar a expressão “previdência social” nos casos de velhice (art.158, XVI), dispondo:

Art.158. A Constituição assegura aos trabalhadores os seguintes direitos, além de outros que, nos termos da lei, visem à melhoria, de sua condição social:

(...)

XVI- previdência social, mediante contribuição da União, do empregador e do empregado, para seguro-desemprego, proteção à maternidade e, nos casos de doença, velhice, invalidez e morte;

 

A Emenda Constitucional Nº 1, de 1969, no art.165, XVI, estabelece previdência social nos casos de velhice, nos seguintes termos:

Art. 165. A Constituição assegura aos trabalhadores os seguintes direitos, além de outros que, nos termos da lei, visem à melhoria de sua condição social:

 (...)

XVI- previdência social nos casos de doença, velhice, invalidez e morte, seguro-desemprego, seguro contra acidentes do trabalho e proteção à maternidade, mediante contribuição da União, do empregador e do empregado.

 

Na Carta Magna atual, promulgada em 1988, encontramos no art.201 a proteção às pessoas portadoras de idade avançada (atual redação). A redação anterior falava-se em aposentadoria por velhice, conceito esse que foi alterado com o surgimento da Lei Nº 8.213/91.  A denominação utilizada atualmente é mais correta, pois o fato de a pessoa ter 60 ou 65 anos não quer dizer que seja velha, deve ser levado em consideração condições pessoais, qualidade de vida, trabalho exercido, condições físicas e mentais, entre outros aspectos.

 

Como já aventado anteriormente, no Brasil para que o segurado tenha direito à percepção da aposentadoria por idade, além da idade cronológica, também há necessidade de preencher outro requisito que é o cumprimento do período de carência. Destacaremos no presente trabalho a importância do cumprimento de tal requisito, bem como das dificuldades encontradas pelos segurados quando do requerimento da aposentadoria por idade.   

 

III. APOSENTADORIA POR IDADE NA LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL, NATUREZA JURÍDICA E APLICAÇÃO DA TABELA PROGRESSIVA

 

A Lei Nº 8.213/91 – Lei Básica da Previdência Social que dispõe sobre os planos de benefícios da previdência social elenca dentre os diversos benefícios previstos para abrigar os riscos delineados na Constituição, como proteção ao trabalhador idoso, a chamada Aposentadoria por Idade, previsto no art.48 a 51.

 

A aposentadoria por idade é espécie de benefício previdenciário que é devido ao segurado que completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60(sessenta), se mulher.

 

O  Art. 48, da Lei Nº 8.213/91, dispõe:  

“A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 anos de idade, se homem, e 60, se mulher”.

 

Todos os segurados são beneficiários desta espécie de benefício a saber: segurado empregado; empregado doméstico, contribuinte individual, avulso, segurado especial e segurado facultativo. Os dependentes não fazem jus ao percebimento da aposentadoria por idade.

 

Para melhor elucidar a análise da norma jurídica quanto à aposentadoria por idade, descreveremos precedente doutrinário que espelha nosso entendimento quanto ao tema em estudo, assim transcrito:

“  I- Antecedente normativo  

I.1) Critério material

a) Requisito subjetivo: ser segurado. A partir da Lei nº10.666/03, a perda da qualidade de segurado não mais influi na concessão das aposentadorias. Assim, basta o segurado ter completado o requisito objetivo (período de carência) e o requisito próprio do benefício (idade), não se indagando acerca da qualidade de segurado.

b) Requisito objetivo: período de carência, que se compõe de duas regras: a) quem ingressou no RGPS antes da Lei nº 8.213/91, aplicação da regra de transição do artigo 142 da referida lei, que prevê para o ano de 2007, 156 contribuições mensais; b) para quem ingressou no RGPS após a Lei nº 8.213/91, 180 contribuições mensais.

c) Requisito próprio do benefício: idade. Para o exercente de atividade urbana: 65 anos de idade, se homem; 60 anos de idade, se mulher. Para o rurícola: 60 anos de idade, se homem; 55 anos, se mulher.

I.2) Critério espacial: todo o território nacional

I.3) Critério temporal

a) Início

a.1) Para os segurados empregados, inclusive o doméstico:

I- da data do desligamento, se requerido no período  de 90 dias depois dela.

II- da data do requerimento administrativo, quando não houver desligamento do empregou ou quando for requerida após o prazo previsto no item I.

a.2) Para os demais segurados:

Da data do requerimento.

b) Término

Com a morte do segurado.

II) Conseqüente Normativo

II.1) Critério pessoal

Sujeito ativo: todos os segurados.

Sujeito passivo: INSS

II.2) Critério quantitativo

base de cálculo: salário-de-benefício

Alíquota: 70% acrescido de 1% para cada grupo de 12 contribuições até o limite de 100%.” (TSUTIYA, 2007, p.322/323)

 

São requisitos indispensáveis para concessão desta espécie de benefício:

- a filiação à Previdência;

- requisito etário (sessenta e cinco anos para os homens e sessenta para as mulheres).

- cumprimento do prazo de carência;

 

A filiação do segurado ocorre através do exercício de atividade remunerada, prevista em lei, em ocorrendo o efetivo pagamento das contribuições previdenciárias relativas àquele período, não há como se negar que tal período deva ser considerado para todos os efeitos, inclusive como tempo de carência.

 

Por período de carência, entende-se o tempo correspondente ao número mínimo de contribuições mensais indispensáveis para que o beneficiário faça jus a determinado benefício, consideradas a partir do transcurso do primeiro dia dos meses de suas competências. Durante o período de carência dos benefícios, os segurados não farão jus ao recebimento do benefício, por ser uma das condições para o deferimento.

 

Para os segurados contribuinte individual e facultativo, exige-se o recolhimento efetivo das contribuições previdenciárias. Alteração importante foi a introduzida pela Lei nº10.666/03 que passou a considerar presumidamente o recolhimento do contribuinte individual que presta serviço para pessoa jurídica, a partir da competência de abril de 2003, desde quando a empresa deverá efetuar o desconto das contribuições previdenciárias e efetivar o repasse ao INSS.

 

Já o segurado empregado, o trabalhador avulso e o empregado doméstico não há que se exigir o efetivo recolhimento das contribuições previdenciárias, bastando o exercício de atividade remunerada prevista no regime geral de previdência social, uma vez que o recolhimento do tributo é responsabilidade da empresa empregadora ou tomadora de serviço. 

 

Para os segurados empregados, doméstico, avulso e especial, a data de início do período de carência deverá ser a de filiação, bem como para o contribuinte individual que presta serviços para pessoa jurídica, caso a sua filiação ocorra a partir de abril de 2003. Para os demais segurados, deve-se considerar como termo a quo a data da primeira competência em que houve o recolhimento de contribuição previdenciária, independentemente de o recolhimento ter sido realizado em atraso ou não. 

 

Vale ressaltar que as contribuições vertidas para regimes próprios de previdência social dos servidores públicos, anteriores a Lei nº 8.647/93, serão considerados para todos os efeitos, inclusive para os de carência.

 

A carência, como aspecto temporal integrante da hipótese de incidência previdenciária da aposentadoria por idade, tem, como regra geral, o limite definido no art. 25, inc. II, da Lei de regência:

Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no art. 26: (..) II - aposentadoria por idade, aposentadoria por tempo de serviço e aposentadoria especial: 180 contribuições mensais.

(Redação dada pela Lei nº 8.870, de 15.4.94)

 

Ocorre, contudo, que tal valor é a regra geral, mas não a única. A interpretação daquele dispositivo deve ser feito no contexto da Lei 8.213/1991. Além da ressalva expressa feita no caput do art. 25, que menciona as hipóteses do art. 26, o dispositivo legal deve ser interpretado sistematicamente, já que existe, ainda, outra exceção legal, esta prevista no art. 142 da mesma lei, inserido nas disposições finais e transitórias daquele Diploma.

 

Dispõe o art. 142 da Lei 8.213/91:

“Para o segurado inscrito na Previdência Social Urbana até 24 de julho de 1991, bem como para o trabalhador e o empregador rural cobertos pela Previdência Social Rural, a carência das aposentadorias por idade, por tempo de serviço e especial obedecerá à seguinte tabela, levando-se em conta o ano em que o segurado implementou todas as condições necessárias à obtenção do benefício:

Como se vê, além da regra geral imposta a todos os beneficiários do sistema previdenciário advindo com a Lei 8.213/1991, há ressalva legal para aqueles que, uma vez inscritos nos regimes anteriores (dentre eles o decorrente da CLPS), estiveram, por algum tempo, sujeitos a regime jurídico diferente.

 

Vale lembrar que no regime pretérito o benefício similar ao postulado tinha prazo de carência de apenas 60 meses (= 5 anos), conforme delineava a Consolidação das Leis Previdenciárias (Decreto 89.312/84):

Art. 32. A aposentadoria por velhice é devida ao segurado que, após 60 (sessenta) contribuições mensais, completa 65 (sessenta e cinco) anos de idade se do sexo masculino, ou 60 (sessenta) se do feminino, consistindo numa renda mensal calculada na forma do § 1º do artigo 30, observado o disposto no § 1º do artigo 23.

 

Logo, a nova Lei quis, claramente, estipular dois regimes de carência: o novo regime, com prazos maiores válidos para os novos segurados e regime transitório, com prazos diferenciados para os que já haviam sido segurados e que tiveram o prazo de carência abruptamente majorado.

 

Por isso, para os segurados filiados ao sistema antes da vigência daquela Lei, “a carência das aposentadorias por idade (..) obedecerá à seguinte tabela, levando-se em conta o ano em que o segurado implementou todas as condições necessárias à obtenção do benefício (...)”.

 

Ou seja, para os filiados antes da Lei 8.213/1991, ainda que utilizadas as contribuições anteriores à perda da qualidade de segurado para fins de carência, deverá ser comprovado o número necessário conforme a tabela prevista no art. 142 daquele Diploma legal.

 

Ocorre, contudo, que o disposto no §1o do art. 3o da Lei 10.666/2003 não pode ser aplicado em sua literalidade quando determina a busca na tabela do art. 142 da Lei 8.213/1991, pela data do requerimento, pois implicaria sua inconstitucionalidade substancial.

 

Ora, em relação à inconstitucionalidade da referida busca, basta seja analisada a hipótese de dois segurados nascidos no mesmo ano (ex: idade suficiente para o benefício no ano de 2003) com idêntico tempo de serviço (ex: 135 contribuições), mas requerimentos administrativos em anos distintos (ex: um em 2003 e o outro em 2004). Eventual impossibilidade de se conceder o benefício a um e deferi-lo a outro, força o reconhecimento da violação ao princípio da igualdade, pois o elemento discriminador utilizado não guarda pertinência razoável com os elementos que pretende discriminar.

 

Para o segurado inscrito na Previdência Social Urbana até 24 de julho de 1991, bem como para o trabalhador rural e o empregador rural, cobertos pela Previdência Social Rural, a carência da aposentadoria deverá observar a tabela do art.142, da Lei nº 8213 / 91, levando-se em conta o ano em que o segurado implementou as condições necessárias à obtenção do benefício.

 

Descreveremos a tabela do art.142, tendo em vista que as considerações importantes sobre o tema serão tecidas a partir do estudo da referida tabela:

Ano de implementação das condições

Meses de contribuições exigidos

1991

60 meses

1992

60 meses

1993

66 meses

1994

72 meses

1995

78 meses

1996

84 meses

1997

90 meses

1998

96 meses

1999

102 meses

2000

108 meses

2001

114 meses

2002

120 meses

2003

126 meses

2004

132 meses

2005

138 meses

2006

144 meses

2007

150 meses

2008

156 meses

2009

162 meses

2010

168 meses

2011

174 meses

2012

180 meses

 


Com a edição da Lei nº 9.032, de 28/04/1995, alterou-se a tabela, passando a vigorar nos seguintes termos: 
 

Ano de implementação das condições

Meses de contribuições exigidos

1991

60 meses

1992

60 meses

1993

66 meses

1994

72 meses

1995

78 meses

1996

90 meses

1997

96 meses

1998

102 meses

1999

108 meses

2000

114 meses

2001

120 meses

2002

126 meses

2003

132 meses

2004

138 meses

2005

144 meses

2006

150 meses

2007

156 meses

2008

162 meses

2009

168 meses

2010

174 meses

2011

180 meses

 


O artigo 182, do Decreto nº 3.048/99, estabelece o seguinte:

“Art.182. A carência das aposentadorias por idade, tempo de contribuição especial para os segurados inscritos na previdência social urbana até 24 de julho de 1991, bem como para os trabalhadores e empregadores rurais amparados pela previdência social rural, obedecerá à seguinte tabela, levando-se em conta o ano em que implementou todas as condições necessárias à obtenção do benefício: (grifos nossos)

(...)”  

 

Na Instrução Normativa INSS/PRES Nº20, de 11 de outubro de 2007, publicada no DOU de 10/10/2007, encontramos referência à carência e a tabela progressiva, nos seguintes termos:

“Art.57. Para o segurado inscrito na Previdência Social até 24 de julho de 1991, a carência das aposentadorias por idade, tempo de contribuição e especial, bem como para os trabalhadores e empregadores rurais amparados pela antiga Previdência Social Rural, obedecerá à seguinte tabela, levando-se em conta o ano em que o segurado implementou todas as condições necessárias à obtenção do benefício: (grifos nosso)

Ano de implementação

 das condições

Número de meses

 exigidos

1991

60

1992

60

1993

66

1994

72

1995

78

1996

90

1997

96

1998

102

1999

108

2000

114

2001

120

2002

126

2003

132

2004

138

2005

144

2006

150

2007

156

2008

162

2009

168

2010

174

2011

180

 

Parágrafo único. Para os benefícios requeridos até 28 de abril de 1995, véspera da publicação da Lei nº 9.032, considera-se, para a concessão a tabela instituída pela Lei nº 8.213, em sua redação original.”

 

Como o período de carência determina a fruição dos benefícios previdenciários, como requisito indispensável ao direito, se o segurado ou dependente não o integra, não há o direito e, nessa situação encontram-se muitas pessoas de 60 a 65 anos de idade. O que chamamos a atenção é que a falta do período de carência têm impedido inúmeras pessoas de ter concedida a aposentadoria por idade.

 

A ampliação do período de carência foi gradualmente implantada para que de 60 meses fosse exigido 180 meses, o que tem significado a perda do direito a muitos benefícios, especialmente para inúmeros segurados que não tomaram conhecimento dos referidos prazos.

 

Importante salientarmos a importância da não exigência da qualidade de segurado para a concessão da aposentadoria por idade.

 

Antes do advento da Lei 10.666/2003, ao aplicar a lei de ofício (tarefa eminente dos órgãos estatais executivos), a Autarquia Previdenciária negava os pedidos administrativos dos segurados que, na data do requerimento, não possuíssem qualidade de segurado. Argumentava-se que a redação do art. 48 da LBPS deixava claro que a aposentadoria seria devida ao segurado que completasse a idade necessária. Além disso, não se preenchia o requisito da carência, pois, se perdida a qualidade de segurado, as contribuições anteriores só poderiam ser contadas com o cumprimento do disposto no parágrafo único do art. 24 da LBPS. 

 

A aplicação literal da lei pela autarquia previdenciária, levou inúmeros segurados requererem a aposentadoria por idade através de ações judiciais, e a matéria passou a comportar interpretação mais benéfica ao segurado, seja pelo Superior Tribunal de Justiça – intérprete privilegiado da legislação federal (art. 106, III, CR), seja pelos Tribunais Regionais Federais e também pelas Turmas Recursais com competência para julgamento nos Juizados Especiais Federais, cortes competentes para decidir, em segundo momento, sobre eventuais recursos interpostos contra decisões do judiciário que negassem a concessão do benefício.

 

Um dos primeiros julgados do Superior Tribunal de Justiça sobre o tema fixou que:

I - PREVIDENCIÁRIO - APOSENTADORIA POR VELHICE - CONDIÇÕES DE OBTENÇÃO - EX-CONTRIBUINTE DESEMPREGADO AO COMPLETAR A IDADE LIMITE (ART. 32 DA CLPS). II - PROCESSUAL - FUNDAMENTO DO PEDIDO - CONDIÇÕES DE AÇÃO - CONFUSÃO - DECISÃO DE MÉRITO - REFORMA - RETORNO AO TRIBUNAL A QUO.

1. A aposentadoria por velhice subordina-se a adimplemento de duas condições: pagamento de sessenta contribuições mensais e a chegada do aposentado, com vida, ao limite de idade fixada no art. 32 da consolidação das leis da previdência social. quem prestou mais de sessenta contribuições mensais e completa sessenta e cinco anos tem direito à aposentadoria por velhice - ainda que esteja desempregado, sem contribuir para a previdência social.

2. Acordão que extingue o processo, "sem julgamento do mérito", ao fundamento de que o autor não preenche os requisitos da aposentadoria pleiteada. não se confundem as condições da ação, com os fundamentos do pedido. tal decisão, em verdade, apreciou o mérito. ao prover recurso especial, cumpre ao stj reformar integralmente a decisão a quo, sem devolver o processo, para novo julgamento. (STJ - RESP 13392 / PE - 1991/0015742-2 – DJ, 26/04/1993, p. 07169, RSTJ 50/186 – Rel. Min. HUMBERTO GOMES DE BARROS – j. 17/03/1993).

 

O fundamento do direito à aposentadoria, é o trabalho. Se tal exercício é interrompido antes de verificados os pressupostos da aposentadoria, esta se aperfeiçoa. A aposentadoria incorpora-se ao patrimônio do contribuinte. Em contrapartida, o ente previdenciário obriga-se a prestar-lhe os benefícios da inatividade remunerada.

 

Na aposentadoria por idade, o direito se aperfeiçoa através da conjunção de dois requisitos: o pagamento de no mínimo sessenta contribuições e o sexagésimo quinto aniversário para os homens e do sexagésimo aniversário para as mulheres.

 

Antes da Lei 10.666/03 negava-se a aposentadoria ao desempregado, pelo singelo motivo de que não estar empregado, confiscando-lhe um pecúlio construído ao longo das anos, à custa do salário.

 

Posteriormente, em correlação ao crescente número de ações sobre o tema, os julgados foram unificando o entendimento quanto à conclusão, embora por outros fundamentos.

 

Com efeito, colhe-se da jurisprudência:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. PREENCHIMENTO DAS CONDIÇÕES APÓS A PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES DO STJ. 1. A aposentadoria por idade sempre manteve duplo requisito: idade e carência. 2. Precedentes do STJ informam como melhor a interpretação de que pode dar-se a reunião dos requisitos em diferentes momentos, mesmo quando o preenchimento da condição idade ocorra em época onde já tenha o interessado perdido a condição de segurado, se anteriormente cumprido o requisito de carência. (TRF4 – AC 123820 – Processo: 9504273670/RS – j. 18/12/2001, DJU 13/03/2002, p. 1058 – Rel. Des. Federal NÉFI CORDEIRO.)

 

A legislação veio coibir tais distorções com a edição da Lei 10.666/2003, determinou:

Art. 3o A perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão das aposentadorias por tempo de contribuição e especial.

§ 1o Na hipótese de aposentadoria por idade, a perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão desse benefício, desde que o segurado conte com, no mínimo, o tempo de contribuição correspondente ao exigido para efeito de carência na data do requerimento do benefício.

§ 2o A concessão do benefício de aposentadoria por idade, nos termos do § 1o, observará, para os fins de cálculo do valor do benefício, o disposto no art. 3o, caput e § 2o, da Lei no 9.876, de 26 de novembro de 1999, ou, não havendo salários de contribuição recolhidos no período a partir da competência julho de 1994, o disposto no art. 35 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991.

 

Esta lei resultou da conversão da Medida Provisória nº 83, de 12.12.2002, a qual tinha o seguinte texto originário:

Art. 3º A perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão das aposentadorias por tempo de contribuição e especial.

Parágrafo único. Na hipótese de aposentadoria por idade, a perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão desse benefício, desde que o segurado conte com, no mínimo, duzentas e quarenta contribuições mensais.

 

A lei vigente modificou o texto originário quando da conversão, o legislador excluiu o requisito de duzentas e quarenta contribuições mensais previsto no parágrafo único da redação originária da Medida Provisória, passando a exigir somente o número correspondente à carência na data do requerimento. Ele não distingue sequer o tempo de contribuição anterior à perda do posterior, permitindo, assim, sejam eles adicionados. Também não prevê a necessidade de cumprimento de outros requisitos em razão da perda da qualidade para efeito de carência (como ocorre na regra geral do art. 24, parágrafo único).

 

Verifica-se que a lei em comento ao determinar, sem restrição expressa, que “a perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão desse benefício”, o §1o do art. 3o da Lei 10.666/2003 manda que este fato seja desconsiderado quando da apreciação administrativa do requerimento; logo, ela afasta a incidência do parágrafo único do art. 24 da LBPS, já que este dispositivo tem como hipótese justamente a perda da qualidade de segurado.

 

Destaco que tais preceitos normativos foram reiterados pelo legislador quando da aprovação do “Estatuto do Idoso” (Lei 10.741/2003), no qual se previu:

Art. 30. A perda da condição de segurado não será considerada para a concessão da aposentadoria por idade, desde que a pessoa conte com, no mínimo, o tempo de contribuição correspondente ao exigido para efeito de carência na data de requerimento do benefício.

Parágrafo único. O cálculo do valor do benefício previsto no caput observará o disposto no caput e § 2º do art. 3º da Lei nº 9.876, de 26 de novembro de 1999, ou, não havendo salários-de-contribuição recolhidos a partir da competência de julho de 1994, o disposto no art. 35 da Lei nº 8.213, de 1991.

 

Demonstrado está que a partir da Lei nº 10.666/03, a aposentadoria por idade passou a exigir dois requisitos: idade e carência, sendo que a carência é verificada aplicando-se a tabela do art.142 do ano em que o segurado implementou a idade mínima para a concessão do benefício e não quando do requerimento deste, como tem sido aplicado pelo INSS. Se o segurado requereu o benefício em 2005, mas completou a idade mínima no ano de 2004, a carência exigida será de 138 contribuições, e não de 144 como vem exigindo a autarquia previdenciária.

 

A Lei nº 10.666/03 diz que na data do requerimento o segurado deve contar com a carência necessária para usufruir o benefício, sem dizer quando a carência será verificada, se pelo ano em que o segurado implementou a idade ou se pelo ano do requerimento. Tal dúvida é facilmente elidida pela leitura do art.142, da Lei nº8.213/91, que indica que a carência a ser verificada é a do ano em que o segurado implementar a idade mínima para a concessão do benefício. Considero que a lei deve ser interpretada a favor do segurado que pela idade avançada e pela dificuldade de ser reinserido no mercado de trabalho, ou de permanecer no mercado de trabalho, é considerado elegível a aposentadoria por idade.

 

Merece destacar que os requisitos para a concessão de benefícios não precisam ser preenchidos simultaneamente, em se tratando de aposentadoria por idade, como reiteradamente tem decidido o STJ.

 

Quanto aos segurados que completaram a idade antes do advento da Lei nº 10.666/03, a doutrina tem entendido que como se exigia a manutenção da qualidade de segurado, a carência deverá ser exigida na data de sua publicação, por ser essa a data a partir da qual passou a se exigir a qualidade de segurado, ou seja, deve o segurado comprovar pelo menos a carência de 132 contribuições.

 

Entendo que há que se utilizar a legislação mais benéfica ao segurado considerando o caráter de proteção social dos benefícios previdenciários estampados no texto constitucional, a aplicabilidade da lei de benefícios à hipótese fática terá o condão de permitir uma vida mais digna aos segurados.

 

Esse é o entendimento do eg. STJ conforme se verifica dos seguintes julgados:

“PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR URBANO. ARTIGOS  25. 48 E 142 DA LEI 8.213/91. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. IMPLEMENTAÇÃO SIMULTÂNEA. PRESCINDIBILIDADE. VERIFICAÇÃO DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS. IDADE MÍNIMA E RECOLHIMENTO DAS CONTRIBUIÇÕES DEVIDAS. ARTIGO 102, PARÁGRAFO 1º DA LEI 8.2313/91. PRECEDENTES. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.

1-           A aposentadoria por idade, consoante os termos do artigo 48 da Lei nº8.213/91, é devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta lei, completar 65 anos de idade, se homem, e 60 anos de idade, se mulher.

2-           O artigo 25 da Lei 8.213/91 estipula a carência de 180 (cento e oitenta) meses de contribuição para obtenção da aposentadoria por idade para o trabalhador urbano.

3-           O artigo 142 da Lei 8.213/91, por sua vez estabelece regra transitória de cumprimento do período de carência, restrito aos segurados urbanos inscritos na Previdência Social até 24 de julho de 1991, data da vigência da Lei, conforme tabela inserta no referido dispositivo.

4-           A perda da qualidade de segurado, após o atendimento aos requisitos da idade mínima e do recolhimento das contribuições previdenciárias devidas, não impede a concessão da aposentadoria por idade. Precedentes.

5-           Ademais, os requisitos exigidos pela legilslação previdenciária não precisam ser preenchidos simultaneamente, no caso de aposentadoria por idade. Precedentes. Interpretação do artigo 102, 1º da Lei nº8.213/91.

6- Sobre o tema cumpre relembrar que o caráter social da norma previdenciária requer interpretação finalística, ou seja, em conformidade com os seus objetivos.”  (STJ – AGRESP Nº698009 – Quinta Turma – Rel. Min. Gilson Dipp. Publicado no DJ de 16/05/2005). 

 

A aposentadoria por idade é devida pela presunção de que a idade faz surgir uma incapacidade para o trabalho. Tal presunção é reforçada não apenas pela perda da força pelo cidadão cuja idade é avançada, mas também pelas regras de experiência do que normalmente ocorre (art. 5o Lei 9.099/1995, e art. 335 CPC), sobremodo durante a contínua crise econômica que produz uma alta competitividade no mercado de trabalho. Logo, imputar à mora de um dos segurados a qualidade de elemento de extinção do seu direito não é conduta que se coaduna com a presunção decorrente da idade.

 

Muitas vezes a falta de informação é responsável pela mora do segurado em buscar seu direito. Logo, ela não pode afetar o fundo do direito consistente no gozo de benefício etário, mas tão-somente as parcelas que deixou de auferir porque não as buscou tempestivamente. Pensar de forma diversa seria atribuir a esta mora o caráter de fato extintivo de direito similar à decadência, o que não se afigura razoável.

 

Portanto, diante da ausência de situação distinta nos casos exemplificados, resta certa a conclusão de que a distinção trazida pela lei viola o princípio da isonomia jurídica, devendo, por isso, ser interpretado de forma a aplicar o art. 142 da LBPS, com base no ano em que o segurado completou a idade necessária à aposentadoria, servindo o requerimento administrativo apenas como termo inicial da mora da entidade previdenciária para pagamento das parcelas decorrentes da nova situação jurídica do segurado.

 

Outro ponto relevante diz respeito à forma de cálculo do valor do benefício. A renda mensal da aposentadoria por idade será de 70% do salário – de - benefício, mais 1% deste por grupo de 12 contribuições mensais, até o máximo de 30%. Os salários – de – benefício apurados são as contribuições recolhidas após a competência de julho de 1994, aplicando-se o disposto no art. 3o, caput e § 2o, da Lei 9.876/1999.

 

A norma vigente desconsidera a perda da qualidade de segurado, antes do requerimento do benefício, mas não considera as contribuições vertidas, dando ao benefício previdenciário caráter assistencial, pois, a maioria dos segurados que se aposentam por idade, acabam por receber salário-mínimo.

 

A aposentadoria por idade é considerada como compulsória quando requerida pela empresa, quando o segurado homem atinge os 70 anos de idade, e a mulher aos 65 anos de idade. Tal possibilidade encontra amparo legal no art.51, Lei nº 8.213/91, que dispõe que o segurado deverá ter cumprido os seguintes requisitos:  70 anos de idade, se homem; 65 anos de idade, se mulher; cumprido o período de carência, na data em que completou a idade. Tal aposentadoria é considerada como rescisão motivo de rescisão indireta do contrato de trabalho, sendo garantida ao empregado a indenização prevista na legislação trabalhista (demissão sem justa causa), considerada como data da rescisão do contrato de trabalho a imediatamente anterior à aposentadoria.

 

Importante salientar que nada impede que o segurado requeira a aposentadoria por idade e permaneça no trabalho, desde que seja do interesse do empregador, uma vez que o contrato de trabalho tem por requisito a bilateralidade, podendo as partes ajustarem a continuidade dos serviços.

 

A concessão da aposentadoria compulsória também tem gerado problemas aos segurados, pois a autarquia previdenciária tem exigido o cumprimento do período de carência da data da entrada do requerimento e não da data que completou a idade, que ocorre necessariamente 05(cinco) anos antes da aposentadoria compulsória. Não se pode dizer em cumprimento dos requisitos simultaneamente, pois, certamente a idade e a carência podem ocorrer em momentos distintos; o que não impede a concessão da aposentadoria por idade.

 

Para os segurados que atingiram o requisito etário para a concessão da aposentadoria por idade e que estavam em gozo do benefício de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez, existe previsão legal para que tais benefícios sejam transformados em aposentadoria por idade. Segundo disposto no art.29, §5º da Lei nº 8.213/91, se no período básico de cálculo, o segurado tiver recebido benefícios por incapacidade, sua duração será contada, considerando-se como salário – de - contribuição, no período, o salário – de -benefício que serviu de base para o cálculo da renda mensal, reajustado nas mesmas épocas e bases dos benefícios em geral, não podendo ser inferior ao valor de um salário mínimo.

 

Por esse dispositivo, o segurado em gozo de auxílio-doença ou aposentado por invalidez teria computado o tempo de inatividade como de contribuição. Desta  forma, esse tempo também teria que ser contado para o cômputo do período de carência para a aposentadoria por idade. Na prática temos nos deparados com segurados que permanecem anos e anos afastados do trabalho, em gozo de auxílio-doença, que quando atingem a idade não possuem a carência exigida, uma vez que o tempo de inatividade não é contado como carência. Tais procedimentos administrativos distanciam mais e mais os segurados da almejada aposentadoria por idade.

 

5. CONCLUSÃO

 

Conclui-se, que a aposentadoria por idade têm requisito etário e contributivo (um número determinado de contribuições), de acordo com a data em que o segurado começou a contribuir para o regime geral de previdência social, sendo no mínimo 60(sessenta) contribuições para  os que completaram a idade antes da Lei 8.213/1991, ou de acordo com a tabela prevista no art. 142 desta Lei, conforme o ano em que foi atingida a idade mínima, ou, por fim, 180 (cento e oitenta), para aqueles que completarem a partir de 2011.

 

No entanto, para os segurados que não exerceram o direito de requerer o benefício, e para os que o exercem após o implemento do requisito idade, a autarquia previdenciária vem aplicando interpretação diferente para a disposição legal, ou seja, vem exigindo a comprovação do tempo quando do requerimento do benefício, e não quando da implementação da idade necessária para requerimento da aposentadoria.

 

Também inúmeros segurados que migraram do campo para a cidade, e que passaram efetivamente a contribuir para o regime geral de previdência, e que em virtude do labor pesado acabam afastando-se das atividades habituais urbanas e entrando em gozo de benefício por incapacidade de trabalho, quando atingem a idade, também não conseguem transformar o benefício por incapacidade em aposentadoria por idade.

 

Os idosos estão longe de terem uma velhice digna, encontram obstáculos na saúde, no lazer, na alimentação e na previdência social. Mais e mais trabalhadores estão sendo levados a serem amparados por benefícios assistenciais mesmo tendo contribuído aos cofres da previdência social.

 

A aposentadoria por idade, ainda é para muitos idosos um sonho inatingível, embora a legislação pátria tenha avançado, ainda não é o suficiente para consagrar o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana.

 


6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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