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DISTINGUISHING PARA A NÃO DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS DE BOA FÉ POR FORÇA DE TUTELA ANTECIPADA - A LUTA POR JUSTIÇA CONTINUA

Por Alan da Costa Macedo¹

 

A historicidade dos julgamentos que discutem o tema: “devolução de valores recebidos por força de antecipação de tutela posteriormente revogada” pode ser melhor entendida a partir das primeiras decisões do Superior Tribunal de Justiça que começaram a resolver a controvérsia com a ratificação do princípio da Irrepetibilidade de alimentos recebidos de boa-fé.

A jurisprudência havia se consolidado no sentido de ser desnecessária a devolução de valores recebidos de boa-fé por força de antecipação de tutela.

A Turma Nacional de Uniformização da Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais tinha até a súmula 51 (hoje revogada) que deixava expressa a desnecessidade de devolução:

 

“Os valores recebidos por força de antecipação dos efeitos de tutela, posteriormente revogada em demanda previdenciária, são irrepetíveis em razão da natureza alimentar e da boa-fé no seu recebimento.”  (grifamos)

 

Ocorre que o próprio STJ, há algum tempo, começou a se manifestar, a partir de posições isoladas de seus ministros, no sentido de mitigar o instituto da irrepetibilidade. O precedente abaixo, de relatoria do Ministro Napoleão Nunes Maia Filho julgado há quase 10 anos, é um exemplo:

 

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS A TÍTULO DE TUTELA ANTECIPADA POSTERIORMENTE REVOGADA. POSSIBILIDADE. LIMITAÇÃO DO
 

DESCONTO A 10% SOBRE O VALOR LÍQUIDO DA PRESTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
 

1. A tutela antecipada é provimento jurisdicional de caráter provisório, que, nos termos do art. 273, § 3º e 475-O do CPC, tem a sua execução realizada por iniciativa, conta e responsabilidade do exeqüente, que se obriga, se a decisão for reformada, a reparar os danos que o executado haja sofrido.
2. De acordo com o art. 115 da Lei 8.213/91, que disciplina os planos de benefícios da Previdência Social, havendo pagamento além do devido, como no caso, o ressarcimento será efetuado por meio de parcelas, nos termos determinados em regulamento, ressalvada a ocorrência de má-fé.
3. Tendo em vista a natureza alimentar do benefício previdenciário e a condição de hipossuficiência do segurado, reputa-se razoável o desconto de 10% sobre o valor líquido da prestação do benefício, a fim de restituir os valores pagos a mais, decorrente da tutela antecipada posteriormente revogada.
4. Embora possibilite a fruição imediata do direito material, a tutela antecipada não perde a sua característica de provimento provisório e precário, daí porque a sua futura revogação acarreta a restituição dos valores recebidos em decorrência dela (art. 273, § 3º e 475-O do CPC).
5. Recurso Especial do INSS provido.


(REsp 988.171/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, QUINTA TURMA, DJ 17/12/2007, p. 343). ( grifamos)


Alguns anos depois, no ano de 2011, precedente do STJ começou a levantar a tese de relativização, inclusive, da “boa fé” daqueles que percebiam benefícios previdenciários precários por força de tutela antecipada:

 

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE POR FORÇA DE DECISÃO JUDICIAL NÃO DEFINITIVA. REFORMA DA DECISÃO EM RECURSO ESPECIAL. CRITÉRIOS PARA IDENTIFICAÇÃO DA BOA-FÉ OBJETIVA. INEXISTÊNCIA DE COMPORTAMENTO AMPARADO PELO DIREITO NO CASO CONCRETO. POSSIBILIDADE DE RESTITUIÇÃO DOS VALORES ART. 46 DA LEI N. 8.112/90. NÃO APLICABILIDADE DA SÚMULA 7/STJ.
 

1. O art. 46 da Lei n. 8.112/90 prevê a possibilidade de restituição dos valores pagos indevidamente aos servidores públicos. Trata-se de disposição legal expressa, não declarada inconstitucional e, portanto, plenamente válida.
2. Esta regra, contudo, tem sido interpretada pela jurisprudência com alguns temperamentos, mormente em decorrência de princípios gerais do direito, como a boa-fé. A aplicação desse postulado, por vezes, tem impedido que valores pagos indevidamente sejam devolvidos.
3. A boa-fé não deve ser aferida no real estado anímico do sujeito, mas sim naquilo que ele exterioriza. Em bom vernáculo, para concluir se o agente estava ou não de boa-fé, torna-se necessário analisar se o seu comportamento foi leal, ético, ou se havia justificativa amparada no direito. Busca-se, segundo a doutrina, a chamada boa-fé objetiva.
4. Na análise de casos similares, o Superior Tribunal de Justiça tem considerado, ainda que implicitamente, um elemento fático como decisivo na identificação da boa-fé do servidor. Trata-se da legítima confiança ou justificada expectativa, que o beneficiário adquire, de que valores recebidos são legais e de que integraram em definitivo o seu patrimônio.
 
5. É por esse motivo que, segundo esta Corte Superior, os valores recebidos indevidamente, em razão de erro cometido pela Administração Pública ou em decorrência de decisão judicial transitada em julgado e posteriormente reformada em ação rescisória, não devem ser restituídos ao erário. Em ambas as situações, eventual utilização dos recursos por parte dos servidores para a satisfação das necessidades materiais e alimentares é plenamente justificada. Objetivamente, a fruição do que foi recebido indevidamente está acobertada pela boa-fé, que, por sua vez, é consequência da legítima confiança de que os valores integraram em definitivo o patrimônio do beneficiário.
6. Situação diferente - e por isso a jurisprudência do STJ permite a restituição - ocorre quando os valores são pagos aos servidores em decorrência de decisão judicial de característica precária ou não definitiva. Aqui não há presunção de definitividade e, se houve confiança neste sentido, esta não era legítima, ou seja, não era amparada pelo direito.
7. Se não havia razão para que o servidor confiasse que os recursos recebidos integraram em definitivo o seu patrimônio, qualquer ato de disposição desses valores, ainda que para fins alimentares, salvo situações emergenciais e excepcionais, não pode estar acobertado pela boa-fé, já que, é princípio basilar, tanto na ética quanto no direito, ninguém pode dispor do que não possui.
8. No caso dos autos, os valores que foram pagos aos servidores não são decorrência de erro de cálculo efetuado pela administração, mas sim de decisão judicial que ainda não havia transitado em julgado, e que foi posteriormente reformada. Ademais, em nenhum momento houve concordância da administração com a quantia que foi paga, o que demonstra que sempre houve controvérsia a respeito da titularidade.
9. Se os agravantes utilizaram desses valores, sem possuir a legítima confiança de que lhes pertenciam, não há como identificar a boa-fé objetiva nessa conduta. Portanto, sendo a decisão judicial final desfavorável aos servidores, a devolução do que foi pago indevidamente se faz possível, nos termos do art.  46 da Lei n. 8.112/90.
10. Vale ressaltar que concluir pela ausência de boa-fé objetiva dos agravantes não implica em violação da Súmula 7/STJ, pois em nenhum momento se negou ou alterou os fatos que foram consignados pela instância ordinária, eles apenas sofreram uma nova qualificação jurídica. Agravo regimental improvido.(AgRg no REsp 1263480/CE, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, DJe 9/9/2011).
 

Como se pôde observar no julgado acima, o Ministro Humberto Martins considera, para a relativização da boa-fé objetiva, o fato do servidor público “ter ciência de que a decisão é precária“ e, por isso, não poder considerar aquelas verbas (mesmo as de caráter alimentar) como suas.
 

Olvidou-se, o Ministro, no entanto, que a boa-fé também poderia ter sido verificada a partir da “confiança” que o jurisdicionado tem no “Estado-Juiz” que, ao observar a verossimilhança das alegações (juízo de quase certeza) e o perigo da demora, adianta-lhe a fruição daquilo que entende seu por direito.
 

Talvez tenha faltado, no caso, a eloquência no discurso de que as relações jurídicas de “seguro” (seguridade social/Previdência Social) comportam certo” risco no empreendimento”, sendo o pagamento do benefício um “prêmio” pelo “sinistro” (contingência social) e que a” solidariedade” do sistema comporta esses pagamentos indevidos e posteriormente cessados. Nesse caso, quem deve suportar o prejuízo no caso da “dúvida” sobre a existência do direito, o segurado ou a seguradora?
 

Noutro passo, talvez também não se tenha alegado que, quando o Poder Judiciário (representado, no ato, pelo Juiz) tutela, de forma antecipada, o direito ao usufruto de um benefício de caráter alimentar, avoca para si a responsabilidade sobre o eventual “erro de interpretação”.
 

Diante do princípio da confiança, a boa-fé do jurisdicionado não pode ser relativizada quando a tutela do seu direito foi avocada pelo órgão do Poder Judiciário, o Juiz. Nessa linha, estando alguém obrigado a devolver valores por força de “erro” de interpretação dos fatos e direito da “administração pública” (in, casu, Estado-Juiz), seria esta a responsável pela devolução e não o jurisdicionado.
 

Ocorre que a jurisprudência do STJ caminhou em sentido oposto. Em 2013, citando os precedentes acima transcritos, o Ministro Herman Benjamim, no Resp n° 1.384.418 – SC, trouxe com mais força a relativização da boa-fé objetiva para ditar a obrigatoriedade da devolução de benefícios previdenciários recebidos de boa-fé por força de tutela antecipada posteriormente revogada.
 

Segundo aquele Ministro: Não é suficiente, pois, que a verba seja alimentar, mas que o titular do direito o tenha recebido com boa-fé objetiva, que consiste na presunção da definitividade do pagamento.”²
 

Apesar dessa conclusão sobre a possibilidade de devolução dos valores percebidos por força de tutela antecipada posteriormente revogada, o Ministro Herman Benjamim, no Resp nº 1.384.418-SC, deixou clara a forma de devolução a preservar a dignidade da pessoa humana:
 

“Indubitavelmente, o caráter alimentar dos benefícios previdenciários está indissociavelmente ligado ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, de forma que as imposições obrigacionais sobre os respectivos proventos não comprometam o sustento do segurado.
 

O princípio da dignidade da pessoa humana, na sua dimensão objetiva,
 

visa garantir um contexto adequado à subsistência do indivíduo.
 

O desafio a ser enfrentado nessa fase da argumentação, em que se
 

concluiu pela necessidade de devolução da antecipação de tutela posteriormente revogada, é parametrizar critérios de ressarcimento que respeitem o mencionado superprincípio.
 

Há vários paradigmas legais que demonstram qual o grau de comprometimento da remuneração que não prejudica o sustento do titular de verba alimentícia.
 

(...)
 

Assim, à luz do princípio da dignidade da pessoa humana e levando-se em conta o dever do segurado de devolução do valores recebidos por força de antecipação de tutela posteriormente revogada, devem ser observados os seguintes parâmetros para o ressarcimento:
 

a) a execução de sentença declaratória do direito deverá ser promovida;
b) liquidado e incontroverso o crédito executado, o INSS poderá fazer o desconto em folha de até 10% da remuneração dos benefícios previdenciários em manutenção do mesmo segurado até a satisfação do crédito.”

 

O caso concreto relacionado ao julgamento do Recurso Especial acima citado se referia a acumulação ilegal de Pensões.  Com a cessação da pensão indevida, remanesceu o outro benefício previdenciário que suportava o desconto de 10% para a devolução dos valores percebidos indevidamente.
 

O que não foi tratado pelo julgado acima foram os casos em que, com a cessação do benefício indevido, não remanesce ao segurado nenhum outro benefício previdenciário. Como, então, devolver as verbas alimentares? “Regurgitando os alimentos?”
 

A partir desse paradigma de relatoria do Ministro Herman Benjamim, algumas outras decisões do STJ se firmaram no mesmo sentido e a Primeira Seção do STJ, no julgamento do Recurso Especial Repetitivo 1.401.560/MT, ocorrido em 12/2/2014, relator p/ acórdão Ministro Ari Pargendler, assentou a tese de que é legítimo o desconto de valores pagos aos beneficiários do Regime Geral de Previdência Social- RGPS, em razão do cumprimento de decisão judicial precária posteriormente cassada. A certidão abaixo transcrita afirma que a tese firmada decorre do voto do Ministro Ari Pargendler:
 

“Certifico que a egrégia PRIMEIRA SEÇÃO, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

"A Seção, por maioria, vencidos os Srs. Ministros Relator, Arnaldo Esteves Lima e Napoleão Nunes Maia Filho, deu provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Ari Pargendler que lavrará o acórdão." Votaram com o Sr. Ministro Ari Pargendler os Srs. Ministros Herman Benjamin, Mauro Campbell Marques e Benedito Gonçalves.  ( grifamos)

 

O Voto do Ministro Ari Pargendler pode ser lido, abaixo, na íntegra:

 

“O Código de Processo Civil de 1939 só autorizava a execução de sentença transitada em julgada, ou de sentença cujo recurso não tivesse efeito suspensivo. As ações cautelares de então eram típicas, isto é, expressamente previstas em lei, e só visavam preservar o objeto do processo. O Código de Processo Civil de 1973, na sua feição originária, não alterou esse quadro, salvo quanto ao poder cautelar geral do juiz, a autorizar que a tutela preventiva fosse além das medidas cautelares típicas. Comum a todas era a provisoriedade, tal como ocorria no mandado de segurança, e por isso sua eficácia não subsistia além da sentença, de que é exemplo a Súmula nº 405 do Supremo Tribunal Federal.
 

O grande número de ações, e a demora que disso resultou para a prestação jurisdicional, levou o legislador a antecipar a tutela judicial naqueles casos em que, desde logo, houvesse, a partir dos fatos conhecidos, uma grande verossimilhança no direito alegado pelo autor. O pressuposto básico do instituto é a reversibilidade da decisão judicial. Havendo perigo de irreversibilidade, não há tutela antecipada (CPC, art. 273, § 2º). Por isso, quando o juiz antecipa a tutela, está anunciando que seu decisum não é irreversível. Mal sucedida a demanda, o autor da ação responde pelo recebeu indevidamente. O argumento de que ele confiou no juiz ignora o fato de que a parte, no processo, está representada por advogado, o qual sabe que a antecipação de tutela tem natureza precária.
 

Para essa solução, há ainda o reforço do direito material. Um dos princípios gerais do direito é o de que não pode haver enriquecimento sem causa. Sendo um princípio geral, ele se aplica ao direito público, e com maior razão neste caso porque o lesado é o patrimônio público. O art. 115, II, da Lei nº 8.213, de 1991, é expresso no sentido de que os benefícios previdenciários pagos indevidamente estão sujeitos à repetição. Uma decisão do Superior Tribunal de Justiça que viesse a desconsiderá-lo estaria, por via transversa, deixando de aplicar norma legal que, a contrario sensu , o Supremo Tribunal Federal declarou constitucional. Com efeito, o art. 115, II, da Lei nº 8.213, de 1991, exige o que o art. 130, parágrafo único na redação originária ( declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal - ADI 675) , dispensava.
 

"Quando a Constituição, no artigo 5º, XXXV," - lê-se no voto do Ministro Moreira Alves ao julgar a ADI 675 - "declara que 'a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito', isso importa dizer que não pode a lei impedir que a prestação jurisdicional seja completa, e que, portanto, a decisão definitiva do órgão judiciário que reconhece a lesão ao direito esteja impedida de alcançar os efeitos pretéritos a ela, e que também foram submetidos à apreciação judicial, pelo fato de haver decisão intermediária - que, por isso, mesmo, não esgota a prestação jurisdicional - em sentido contrário".
 

Orientação a ser seguida nos termos do art. 543-C do Código de Processo Civil: a reforma da decisão que antecipa a tutela obriga o autor da ação a devolver os benefícios previdenciários indevidamente recebidos .
 

Voto, por isso, no sentido de conhecer do recurso especial, dando-lhe provimento para expungir da parte dispositiva do voto condutor do acórdão impugnado o seguinte trecho: "dispensando a autora da repetição das parcelas recebidas até a cessação dos seus efeitos" (e-stj, fl. 128). ( grifamos)

 

Como se pôde observar, data vênia, as premissas utilizadas pelo Ministro Ari Pargendler sustentariam mais a tese de um “Membro do Poder Executivo” (talvez um Ministro da Economia) do que a de um Juiz que interpreta as leis sob os primados da Constituição Federal e reitores do Estado Democrático de Direito.
 

Contraditório o voto com os próprios argumentos, já que afirma a exigência do “legislador” de verossimilhança (juízo de quase certeza do Juiz) para a concessão da tutela antecipada e, em seguida, tira tal responsabilidade do Juiz para passar para o “advogado” daquele que pretende se alimentar com o direito invocado. Segundo o Ministro, em outra palavras: “- Se o advogado da parte sabe que a tutela é provisória, deveria ele orientar ao seu cliente que guardasse o salário mínimo do benefício previdenciário em uma poupança até ao provimento jurisdicional definitivo. Naquele interregno ( anos a fio), poderia ele pedir esmolas para se alimentar e, caso tivesse o provimento definitivo a seu favor, pagava àqueles que os ajudaram naquele período”.
 

Noutra monta, ignoraram aqueles que acompanharam o voto vencedor do Ministro Pargendler acima transcrito, o fato de se tratar de uma relação de “seguro social” em que a álea (risco de prejuízo ou possibilidade de lucro) é inerente aos sistemas de seguro e que os cálculos atuariais que são feitos para o sistema de previdência deveriam prever tais hipóteses de prejuízos como também as possibilidades de lucro (quando alguém contribui por longos anos e morre sem ter tido qualquer contraprestação do sistema) diante da “ solidariedade” inerente ao sistema previdenciário ( STF já afirmou e reafirmou esse instituto) .
 

Enfim, esta posição genérica e insubsistente, que não abarca todos os casos, prevaleceu. A súmula 51 da TNU foi cancelada e, hoje, inúmeros miseráveis serão chamados a devolver aquilo que, de “boa-fé”, (aquela respaldada pela tutela do Estado Juiz) receberam, mesmo nos casos em que não tem como e com o que devolver.
 

Entendemos, porém, que os inúmeros casos e circunstâncias reclamarão tratamento diferenciado.
 

Sabemos que o tema dos recursos repetitivos acaba por confundir-se com a técnica de aplicação dos precedentes. Firmado um precedente, este acaba por ser seguido nos casos similares ou que se identifiquem com a mesma tese estabelecida.
 

Ocorre que se o caso posterior for diverso daquele retratado no precedente e tiver peculiaridades que lhes são próprias, que reclamam novas valorações hermenêuticas, estará aberto o caminho para que o órgão jurisdicional afirme não haver precedente, por se tratar de novo caso, ainda não examinado pelos Tribunais firmadores da tese invocada.
 

Haverá, nesse caso, o que chamamos de distinguishing, a afastar a aplicação do precedente ou da tese firmada naquele. O precedente pode, enfim, ser afastado ou mesmo mitigado, se o novo caso que se apresenta contém uma particularidade que merece novo tratamento ou solução diversa.
 

Uma das questões que vão, certamente, provocar as manifestações em “distinguishing” é o fato de , em alguns casos, não remanescer qualquer benefício previdenciário após a cessação daquele considerado indevido por força de tutela antecipada revogada. Terão, os beneficiários, a mesma obrigação de devolver? Como e com o que devolverão se muitos deles não tem nem mesmo o bem de família (impenhorável) ?
 

Estamos certos que, apesar de sabermos das recentes decisões do do STF inadmitindo Recurso Extraordinário sobre o tema sob o argumento de que a matéria é infraconstitucional, outros argumentos de ordem Constitucional podem ser utilizados pelos advogados do país a tentar a mudança de entendimento da Corte Suprema e a reapreciação da matéria. Até por que a execução dos valores devidos necessitará do transito em julgado da decisão que declarou o dever de devolução ou o direito do INSS de cobrá-lo.
 

O próprio Supremo Tribunal Federal por diversas vezes recorreu
 

ao distinguish, até mesmo para afastar a incidência de sua própria súmula.
 

Entendemos que não se pode desistir daquilo que se considera “justo”. Infelizmente, passamos por um momento no país em que as decisões judiciais das cortes superiores têm sido mais políticas do que técnicas.
 

Em um país em que os grandes devedores da Previdência (Itaú, JBS etc)³ estão por aí decidindo os rumos da nação (com a força do capital, compram votos e consciências e nomeiam seus representantes nos Poderes) precípua é a insurgência pelo menos daqueles que tiveram acesso ao conhecimento. Precisamos do “grito dos juristas” nos Tribunais Superiores. Precisamos de menos subserviência e mais irresignação.

 


¹ Servidor da Justiça Federal de 1º Grau- TRF1; Bacharel e Licenciado em Ciências Biológicas. Bacharel em Direito pela Universidade Fed­eral de Juiz de Fora. Pós-Graduando em Direito Prev­idenciário – RPPS. Especialista em Ciências da Saúde. Especial­ista em Direito Constitucional, Previdenciário, Processual e Pe­nal. Coordena­dor Geral e Diretor do Departamento Jurídico do Sindicato dos Trabalhadores do Poder Judiciário Federal no Estado de Minas Gerais – SITRAEMG (2014-2017). Atuou como Oficial de Gabinete na 5ª Vara da Sub­seção Judiciária de Juiz de Fora. Conselheiro Pedagógico e Pro­fessor Convidado no IMEPREP. Coordena­dor Pedagógico e Professor nos Cursos de Pós-Graduação e Ex­tensão do IEPREV. Professor dos Cursos de Pós-Graduação em Direito do Trabalho e Direito Público da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC Minas. Professor de Direito Previdenciário na Graduação em Di­reito da Faculdade do Sudeste Mineiro – FACSUM (2016). Autor do Livro: “Benefícios Previdenciários por incapacidade e Pericias  Médicas. Ed Juruá, 2017.
 

² Resp n° 1.384.418 – SC
 

³ https://reporterbrasil.org.br/wp-content/uploads/2017/02/maioresdevedoresprevidencia.pdf